Ao falarmos em Montessori, nossa mente se volta ao método, à apresentação do material dourado ou até mesmo ao quarto Montessori. Porém, Montessori vai além disso, pois Maria Montessori nos deixou um legado de lições que iniciam ainda na infância, preparando crianças e adolescentes para os desafios do dia a dia, e consequentemente para a vida adulta.
Em seu tempo, Montessori apresentou um novo conceito em educação, onde o foco não está no professor, e sim na criança. Prática inovadora até mesmo para os dias atuais. O educador, neste contexto, é um observador que passa a conhecer a criança, respeitando sua individualidade, descobrindo seus interesses e orientando em seu nível de aprendizagem.
Dentro do método, o aluno encontra um ambiente preparado, possuindo o que ela necessita para se desenvolver emocionalmente, cognitivamente e socialmente. Quando falamos de ambiente preparado, estamos nos referindo a um espaço planejado que vai desde a mobília, que deve ser compatível ao tamanho dos alunos, até os materiais de desenvolvimento, cujos objetivos compreendem permitir o manuseio e a lógica do material, bem como despertar a curiosidade e interesse pelo mundo. Assim como nos confirma Carl Rogers (1961), para criar um ambiente interessante à criança, precisa estar contido nele sua cultura e seus valores, tornando o espaço confortável o que por sua vez gera confiança, traz possibilidades de agir, de descobrir, classificar, medir, crescer e ser “ele mesmo”. Destaco aqui a diferença do trabalho do adulto e da criança e a lição de silêncio, cujas relevâncias são fundamentais para toda a vida.
Para o adulto, o trabalho dignifica o homem, já dizia Max Weber. Trabalho é um conjunto de atividades realizadas, é o esforço feito por indivíduos com o objetivo de atingir uma meta, possibilitando ao ser humano transformar a natureza para saciar as suas necessidades. É pelo trabalho que se percebe ações, comportamentos, iniciativas, desenvolvimento de habilidades e funções executivas. E é por meio do trabalho, que as mesmas podem ser experienciadas e aperfeiçoadas.
Maria Montessori, observando a criança, descobriu que existe uma diferença fundamental no tipo de esforço mais comum na infância e o mais recorrente na maturidade. A criança trabalha para o seu desenvolvimento interior: “Através do trabalho, ela se torna consciente e constrói o homem”. E para isso usa aquilo que existe à sua volta: hábitos, costumes e religião. (MONTESSORI, 1952, p. 33)
Somente considerando o trabalho interior e invisível é que podemos compreender as características dos esforços infantis.
“Quando a criança se encontra diante do material, empenha-se num trabalho concentrado, sério, que parece extraído do melhor de sua consciência. Dir-se-ia na verdade que as crianças se colocam em condições de atingir a mais elevada conquista de que seu espírito é capaz: o material revela a inteligência caminhos que, sem ele, seriam inacessíveis”. (Maria Montessori, 1912, p. 183.)
Muitas vezes, nós adultos nos percebemos querendo fazer várias atividades ao mesmo tempo e não nos damos conta do que estamos fazendo, sem presença, sem processo e sem consciência do que estamos realizando. Sejamos como a criança, ou como disse Montessori, “sigamos a criança”. Para tanto, precisamos parar e observar como a criança trabalha, pois ela insiste e persiste no que realiza e, com calma, consegue chegar no objetivo, conquistando sua disciplina ativa e significando sua experiência através da sua emoção.
Outro ensinamento do método é a lição do silêncio, não enquanto estado de alguém que se abstém de falar, mas como um exercício de“estado superior”, que nos conduz a ordem normal das coisas, como uma inibição instantânea que exige um esforço, uma tensão da vontade, que elimina os ruídos da vida cotidiana, como que isolando a alma das vozes exteriores. Este é o silêncio que encontramos em escolas Montessorianas, que é trabalhado diariamente como exercícios de autodisciplina, como caminhar na linha suavemente, ou até sentados observando o dançar da chama na vela, ouvir ruídos do lado de fora ou o simples hábito de inspirar e expirar. Essa técnica, a criança leva para sua vida focando sua atenção e resultando na autorregulação. Vê-se que essa técnica é uma forma de meditação, onde a criança entra em contato com seu EU interior. O silêncio é uma conquista positiva que se obtém graças ao conhecimento e aos exercícios. “Mesmo as crianças podem sentir a poesia do silêncio, de uma pacífica vida nascente”. (William Wordswth, (1770- 1880), apud, Montessori,1912, p.154)
Todas essas contribuições do Método Montessori nos fazem refletir sobre o quão é importante trabalharmos nossas dificuldades, insistirmos nos processos de forma ordenada, individualizada e com atenção plena aos nossos trabalhos do dia, pois quando nos observarmos, nos sentimos e tomamos consciência do nosso EU e, dessa forma, poderemos guiar a criança para um futuro promissor.